gotas de soro -
tempo fraturado à porta de vidro
....................................................: transparência
em meus olhos
(como se a qualquer momento alguém (me) tirasse o torpor do coma ausente)
à cada
vento
sombra
sons o
não
deixa-me paralítico
ainda.
aqui.
domingo, 7 de novembro de 2010
segunda-feira, 11 de outubro de 2010
Aniquilação pelo rosto
para cp ou ma ou, simplesmente,
um segredo na noite dentro
um segredo na noite dentro
olhar um rosto é lentamente - difícil terror na noite dentro.
: árvore abatida machucando
o coração da terra. lembrança da neblina deformada,
límpida fusão no quando
olho o. rosto de. vagar
olhar.
...........lento.
......................g o z o s a m e n t e
(como quem morre nas mãos de um deus de éter)
olhar o rosto lentamente. uma única vez.
(sem voltar sequer a face para o poema que se esvai,
quando a segunda)
: olhar um rosto é dizer nunca mais
domingo, 25 de julho de 2010
domingo, 13 de junho de 2010
De Eugénio de Andrade
Nada.
Nem o branco fogo do trigo
nem as agulhas cravadas na pupila dos pássaros
te dirão a palavra.
Não interrogues não perguntes
entre a razão e a turbulência da neve
não há diferença.
Não colecciones dejectos o teu destino és tu.
Despe-te
não há outro caminho.
Nem o branco fogo do trigo
nem as agulhas cravadas na pupila dos pássaros
te dirão a palavra.
Não interrogues não perguntes
entre a razão e a turbulência da neve
não há diferença.
Não colecciones dejectos o teu destino és tu.
Despe-te
não há outro caminho.
quarta-feira, 21 de abril de 2010
Aborto
para Colombia
e o ventre diz pro menino:
- logo chegará sua hora, terei de morrer pra que você exista.
e o menino:
- ventre que se rasga nunca garantiu ser com existência; minha mãe já me espera com um nome já dado, e ela nem sequer se pergunta se esse nome corresponde ao enigma-em-devir que habita seu dentro.
e o ventre:
-saia!
rompeu-se. sai o menino.
a mãe:
- ah, meu bebê johnson! você será meu príncipe e será o regente de todas as minhas expectativas!
e assim acaba de acontecer mais um natimorto.
- logo chegará sua hora, terei de morrer pra que você exista.
e o menino:
- ventre que se rasga nunca garantiu ser com existência; minha mãe já me espera com um nome já dado, e ela nem sequer se pergunta se esse nome corresponde ao enigma-em-devir que habita seu dentro.
e o ventre:
-saia!
rompeu-se. sai o menino.
a mãe:
- ah, meu bebê johnson! você será meu príncipe e será o regente de todas as minhas expectativas!
e assim acaba de acontecer mais um natimorto.
quinta-feira, 25 de março de 2010
quarta-feira, 3 de março de 2010
Uma noite
para Girassol
choraram o que desaprendi - meu assassínio em corpos-outros (o outro sou eu...) e quem em mim quer chorar e não aparece? pedra tomou lugar de um coração e tenho a alma seca. onde poderei umedecer o pulso de meu coração?
(na fonte do impossível, dentro de uma noite onde ando reluzente e não - me! - sei.)
(na fonte do impossível, dentro de uma noite onde ando reluzente e não - me! - sei.)
sábado, 23 de janeiro de 2010
terça-feira, 12 de janeiro de 2010
Alhures (ou Uma tentativa de primeira nascença ou Elegia para 1201)
A poltrona do ônibus me era desconfortável. Meu corpo não cabia nela. Ajeitava-me de todo o jeito e forma. Tentativas vãs. E não porque meu corpo fosse vasto para tão parco espaço: era exatamente o contrário. Possuía uma liberdade desértica (e para que essa liberdade?).
Eu estava sendo levado para um lugar que, como a poltrona, não me dizia respeito. Minha mãe olhava-me feliz, pensando que eu a acompanhava em sua peregrinação rumo à Basílica. Esse lugar, dentro de mim, era oco.
Somente minha mãe via-me identidade. Para todos os outros eu era um outro-que-não-aconteceu; um aborto que nunca se acabaria. Deixavam-me só com minha mãe, e quando se referiam a mim, dirigiam-se a ela, como se eu fosse um ser incapaz de comunicação. Um selvagem exposto numa jaula à curiosidade alheia.
Olhava janela afora e a paisagem sussurrava dentro de mim. Evocava-me, pedindo minha presença. Eu quase lhe nascia, mas o chamado não era páreo para as histórias polifônicas celebradas por minha mãe e seus frátrios. Irmãos na cristandade. Eu destoava, unigênito órfão, daquela confraria fraterna.
Quando o ônibus enfim chegou ao seu destino, imediatamente perguntei qual era o meu. Imaginava estar num lugar que de uma vez por todas não era o meu. Sentia-me numa terra estrangeira, num lugar onde não conseguia fazer caber meu corpo. Andava como se meu corpo fosse um pé doído, habitando um sapato de número menor.
Caminhávamos em direção à Basílica. O templo com sua imponência assustava-me a alma: era erguido apenas com tijolos empilhados um em cima do outro, com uma quantidade de cimento suficiente para ligá-los. Eu achava tudo isso pouco para toda sua grandeza. O templo me afrontava com a simplicidade de seu esplendor, coisa que me era almejada e ao mesmo tempo impossível. Nunca fui estruturado para grandezas.
Sentia-me reduzido naquele templo e havia perdido a noção de qualquer referência possível que me fizesse humano; tempo, espaço, outro... já não me diziam respeito. Minha atenção foi totalmente sugada pela vastidão dos tijolos empilhados, ao passo que, ao voltar em mim, dei-me conta de que já não estava mais com a equipe cristã que eu acompanhava. Meu único elo com aquele universo era ligado pela presença de minha mãe. Com essa cisão começava a sentir uma vertigem que me incomodava, mas não podia dizer que era ruim; sentia meu corpo em cada uma de suas partes e cada parte que eu mexia, tinha vida. Pensava que se essas partes quisessem, conseguiriam revoltar-se individualmente. Eram todas autônomas. A minha angústia agora consistia em saber o que fazer de um corpo vivo. Percebi que naquele momento aconteceu minha primeira nascença.
Sem minha mãe por perto ganhei a liberdade de ir para onde eu quisesse. E foi o que fiz. Quando saí da Basílica, vi um menino. Todos falavam dele, como os adultos falam das crianças, com uma ternura plástica, tati-bi-tatis. Porém, a criança estava em outro lugar que não era aquele. Sabia exatamente onde ela estava. Já a conhecia de outros tempos. Lembrei-me do que fui minha vida toda: um anônimo buscando seu lugar de nascimento. Imerso naquele desdém, de súbito ele me olha. Sonda meus olhos como se visse minha alma nua. Olhou-me e virou seu rosto para o alto da Basílica, para seu topo. Aquela profundidade me assustou e revelou-me a mim mesmo qual era o meu lugar. Corri sem olhar ao redor e quando menos percebi estava no alto do Templo. Dizia coisas ilegíveis, que ninguém entendia. Havia decifrado o enigma de meu idioma. Descobria as palavras que me diziam e que eu podia comungar com o mundo; descobri um modo de dizê-lo.
Eu já não entendia o outro idioma que me foi imposto. Havia gritos no templo do qual eu não sabia palavra. Estava extasiado com a balburdia que ali acontecia. Era a celebração de meu nascimento. O menino era o único silêncio abaixo de mim. Foi nele que me concentrei. Quando nossa comunhão foi absoluta, ele me sorriu. Entendi o seu chamado e me lancei ao seu encontro. Ele aprovou o que fiz; havia entendido seu silêncio. Durante a queda, entendi o lugar de onde eu era. Pertencia ao lugar onde nasci.
O parto fez-se completo.
Eu estava sendo levado para um lugar que, como a poltrona, não me dizia respeito. Minha mãe olhava-me feliz, pensando que eu a acompanhava em sua peregrinação rumo à Basílica. Esse lugar, dentro de mim, era oco.
Somente minha mãe via-me identidade. Para todos os outros eu era um outro-que-não-aconteceu; um aborto que nunca se acabaria. Deixavam-me só com minha mãe, e quando se referiam a mim, dirigiam-se a ela, como se eu fosse um ser incapaz de comunicação. Um selvagem exposto numa jaula à curiosidade alheia.
Olhava janela afora e a paisagem sussurrava dentro de mim. Evocava-me, pedindo minha presença. Eu quase lhe nascia, mas o chamado não era páreo para as histórias polifônicas celebradas por minha mãe e seus frátrios. Irmãos na cristandade. Eu destoava, unigênito órfão, daquela confraria fraterna.
Quando o ônibus enfim chegou ao seu destino, imediatamente perguntei qual era o meu. Imaginava estar num lugar que de uma vez por todas não era o meu. Sentia-me numa terra estrangeira, num lugar onde não conseguia fazer caber meu corpo. Andava como se meu corpo fosse um pé doído, habitando um sapato de número menor.
Caminhávamos em direção à Basílica. O templo com sua imponência assustava-me a alma: era erguido apenas com tijolos empilhados um em cima do outro, com uma quantidade de cimento suficiente para ligá-los. Eu achava tudo isso pouco para toda sua grandeza. O templo me afrontava com a simplicidade de seu esplendor, coisa que me era almejada e ao mesmo tempo impossível. Nunca fui estruturado para grandezas.
Sentia-me reduzido naquele templo e havia perdido a noção de qualquer referência possível que me fizesse humano; tempo, espaço, outro... já não me diziam respeito. Minha atenção foi totalmente sugada pela vastidão dos tijolos empilhados, ao passo que, ao voltar em mim, dei-me conta de que já não estava mais com a equipe cristã que eu acompanhava. Meu único elo com aquele universo era ligado pela presença de minha mãe. Com essa cisão começava a sentir uma vertigem que me incomodava, mas não podia dizer que era ruim; sentia meu corpo em cada uma de suas partes e cada parte que eu mexia, tinha vida. Pensava que se essas partes quisessem, conseguiriam revoltar-se individualmente. Eram todas autônomas. A minha angústia agora consistia em saber o que fazer de um corpo vivo. Percebi que naquele momento aconteceu minha primeira nascença.
Sem minha mãe por perto ganhei a liberdade de ir para onde eu quisesse. E foi o que fiz. Quando saí da Basílica, vi um menino. Todos falavam dele, como os adultos falam das crianças, com uma ternura plástica, tati-bi-tatis. Porém, a criança estava em outro lugar que não era aquele. Sabia exatamente onde ela estava. Já a conhecia de outros tempos. Lembrei-me do que fui minha vida toda: um anônimo buscando seu lugar de nascimento. Imerso naquele desdém, de súbito ele me olha. Sonda meus olhos como se visse minha alma nua. Olhou-me e virou seu rosto para o alto da Basílica, para seu topo. Aquela profundidade me assustou e revelou-me a mim mesmo qual era o meu lugar. Corri sem olhar ao redor e quando menos percebi estava no alto do Templo. Dizia coisas ilegíveis, que ninguém entendia. Havia decifrado o enigma de meu idioma. Descobria as palavras que me diziam e que eu podia comungar com o mundo; descobri um modo de dizê-lo.
Eu já não entendia o outro idioma que me foi imposto. Havia gritos no templo do qual eu não sabia palavra. Estava extasiado com a balburdia que ali acontecia. Era a celebração de meu nascimento. O menino era o único silêncio abaixo de mim. Foi nele que me concentrei. Quando nossa comunhão foi absoluta, ele me sorriu. Entendi o seu chamado e me lancei ao seu encontro. Ele aprovou o que fiz; havia entendido seu silêncio. Durante a queda, entendi o lugar de onde eu era. Pertencia ao lugar onde nasci.
O parto fez-se completo.
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